EDIVALDO RAFAEL DE SOUZA
Esta breve
comunicação analisa o continente africano antes da chegada dos europeus. Visto
que, é sabido que de forma comumente o currículo seguido nas aulas de História tendem
a focar na história europeia, ressaltando principalmente sobre o período
chamado de Idade Média, que perdurou do século V ao século XV. Com isso,
pode-se dizer que de certa forma a grade curricular negligencia a história do
continente africano durante esse mesmo período. Com isso, o presente estudo
trabalha sobre diversas nuances que estão ligadas a história africana,
destacando aspectos religiosos, culturais, territoriais e políticos. Nesse
sentido, esse resumo poderá ser utilizado nas aulas de história, em turmas do
ensino médio.
Em primeiro
momento quando é analisado sobre o continente africano na grade curricular,
fica evidente que a mesma ganha destaque nos materiais didáticos no período da
chamada pré-história e também da idade antiga, sendo trabalhada quase que
exclusivamente o Egito antigo, e um pouco sobre reinos africanos vizinhos.
Porém, sabe-se que esse continente possui uma história riquíssima que vai muito
além daquilo que é destacado nos livros didáticos.
Em alguns materiais
também é possível estudar um pouco sobre a história de Nzinga Mbandi, também
conhecida como Njinga ou Ginga. A rainha do reino do ndongo, e posteriormente dos
Ngolas, resistiu durante muitos anos a invasões européias em seu território, segundo
Fonseca (2010, p. 393) “Nzinga Mbandi, irmã de Ngola Mbandi, vai se destacar
nas guerras angolanas como líder do processo de resistência a colonização
portuguesa”.
Porém, mesmo
retratando sobre Nginga nos materiais didáticos, geralmente o trecho fica
desconexo com o material que lhe é acompanhado e o estudante fica sem saber todo
o contexto africano daquela época. Dessa forma, entende-se que o livro sucintamente
analisado aqui é muito importante para o aprendizado em sala de aula.
Em relação a
coleção História Geral da África, segundo o site da Unesco (Organização das
Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura)
“[p]ublicada
em oito volumes, a coleção História Geral da África está agora também
disponível em português. A edição completa da coleção já foi publicada em
árabe, inglês e francês; e sua versão condensada está editada em inglês,
francês e em várias outras línguas, incluindo hausa, peul e swahili. Um dos
projetos editoriais mais importantes da UNESCO nos últimos trinta anos, a
coleção História Geral da África é um grande marco no processo de
reconhecimento do patrimônio cultural da África, pois ela permite compreender o
desenvolvimento histórico dos povos africanos e sua relação com outras
civilizações a partir de uma visão panorâmica, diacrônica e objetiva, obtida de
dentro do continente. A coleção foi produzida por mais de 350 especialistas das
mais variadas áreas do conhecimento, sob a direção de um Comitê Científico
Internacional formado por 39 intelectuais, dos quais dois terços eram africanos”
(UNESCO, 2010, s.p).
É possível
encontrar toda a coleção no site da Fundação Palmares. De acordo com a
instituição,
“[p]ara
facilitar o acesso da população brasileira à importante coleção História Geral
da África, a Fundação Cultural Palmares (FCP) disponibiliza em seu portal,
para download, os oito volumes da publicação editada pela Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), o que também
pode ser feito diretamente do site da instituição internacional ou
do Ministério da Educação (MEC)” (PALMARES,
2011. s.p).
Em 2013, o
Ministério da Educação lançou a “Síntese da coleção História Geral da áfrica”,
em dois volumes, que foram divididos da Pré história ao século XV, e do século
XVI ao século XX. Nesse enfoque, será utilizado aqui como recorte temporal o
período compreendido entre os século VII e XV. A edição dos volumes foi
realizada em parceria com a UNESCO e a UFScar (Universidade Federal de São
Carlos). O organizador da síntese foi Valter Roberto Silvério, e os autores
foram Maria Corina Rocha e Muryatan Santana Barbosa.
Após o
lançamento esses livros foram enviados para as escolas públicas brasileiras
juntamente com um cd contendo a versão em pdf. Entretanto, muitos acabaram ficando
abandonados em bibliotecas escolares. Junto com
o material
também foi enviado uma nota, de Macaé Maria Evaristo dos Santos, então Secretária
de Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação
(2013-2014). Segundo Santos (2014, s.p) “A coleção História Geral da África, da
qual originou esta Síntese, foi elaborada por especialistas, principalmente por
africanos, sem a visão eurocêntrica e reducionista para retratar o continente”.
Percebe-se que, como referência realmente é utilizada uma grande quantidade de
pesquisadores africanos como referência.
Já no início da análise
do livro é possível identificar que no século XII, a partir da ascensão do Islã
no continente africano ocorreu diversas mudanças, por exemplo, culturais, territoriais
e religiosas. Essa religião chegou ao continente africano através da invasão
árabe que ocorreu no Egito, localizado no norte do continente. Entretanto,
rapidamente se alastrou por outros locais, tornando-se não só uma religião, mas
também um sistema social. Ressalta-se que, na chegada ao continente a mesma já
havia divisões, entre Xiitas e Sunitas.
Um dos primeiros
povos retratados no livro são os chamados povos do Sudão. De maneira que, “[o]s
Estados do Sudão são criações específicas dos povos negros. Eles estão em
contato com os berberes das bandas meridionais do Saara e mantêm complexas
relações com esses vizinhos de origem branca” (SILVÉRIO, 2013, p. 311).
Os povos do
Sudão possuíam organização política e social. A principal fonte de defesa em
relação a vizinhos passava pelo domínio ao ferro e também a grande quantidade
de cavalos e camelos. Nesse período, essa região era formada por pequenas
unidades agrícolas. Sendo que, o domínio sobre o ferro ajudava tanto na
agricultura quanto na defesa militar de seus territórios. Inclusive, esses
povos eram governados por uma realeza forte e incontestável, que havia se
convertido ao Islamismo.
Segundo o livro,
a chegada do islã nesse local contribuiu para “(...) um crescimento das trocas
econômicas e culturais. Mas, sobretudo, o fator religioso começa a desempenhar
um papel importante na evolução política e social, observada desde o Magrebe
até o Sudão” (SILVÉRIO, 2013, p. 313).
Nesse ínterim, a
comercialização alcançou a África Mediterrânea e a Saariana.
Já na chamada
zona guineana, o modo de vida era baseado na agricultura e na criação de
animais. Esses povos já dominavam a prática de redução do ferro desde o século
IV a.C. Portanto, eles utilizavam alguns materiais feitos de ferro em suas
plantações. Isso possibilitou, inclusive, a formação de cidades e uma rede
trocas entre diversas localidades. Todavia,
“À imagem da
agricultura e da fundição de ferro, as redes de troca seguiram,
indubitavelmente, um desenvolvimento desigual. Nas localidades em que as trocas
eram pouco desenvolvidas faltava um dos motores da centralização do poder e da
formação de um Estado, situação que preservou numerosas sociedades sem Estado,
no oeste africano” (SILVÉRIO, 2013, p. 363-364).
A acumulação de
riquezas por parte de algumas regiões permitiu a construção de grandes monumentos,
um dos exemplos, “(...) é nos oferecido pelos megálitos da Serra-gâmbia,
datados dos séculos VII e VIII. Essa região é notável pelo número dos seus
monumentos megalíticos” (SILVÉRIO, 2013, p. 364).
No Níger, através
de escavações, estudiosos encontraram várias esculturas e artefatos feitos de
bronze. O sítio foi datado como sendo do século IX. Nessa região ainda
existiria:
“A prática de
diversas indústrias, tais como o trabalho em metal, a fabricação de contas e a
tinturaria, tornar-se-ia rapidamente uma característica de várias cidades da
áfrica Ocidental. Numerosas dentre elas tinham grandes mercados, de posição
estratégica e dispostos em intervalos próximos, em função dos recursos que
faziam a sua prosperidade” (SILVÉRIO, 2013, p. 372).
Percebe-se, que essa
região estava em constante troca com outros lugares. De maneira que, isso
possibilitava grande contato desses povos com outras culturas.
Do ponto de vista
geográfico essa região da zona guineana era dividida em dois territórios, a
saber: ”A alta Guiné, aqui, é compreendida como a metade ocidental das terras
litorâneas da África do oeste, entre o Rio Senegal e o Cabo das Palmas. A
porção compreendida entre o Cabo das Palmas e Camarões é conhecida pelo nome de
baixa Guiné (SILVÉRIO, 2013, p. 373).
De acordo com o
estudo há também vestígios de civilizações que viviam nas chamadas zonas
florestais, sendo que esses vestígios são imagens feitas em pedra-sabão. Além
disso, foram localizados monumentos e objetos fálicos nessa região. Sendo que,
posteriormente ao uso desse tipo de arte, eles reproduziram pinturas de homens
e mulheres em sua completude. Evidenciando assim, o alto grau de conhecimento
artístico desses povos.
“Os dados
arqueológicos e etnológicos aparentam igualmente confirmar a hipótese de uma
interação dinâmica entre diversos grupos que entraram em contato em diversos
momentos, em absoluto aquela outra que transforma o surgimento de
características importantes, como o trabalho de ferro e a organização estatal,
em resultado do domínio cultural do Sudão” (SILVÉRIO, 2013, p. 377).
Em outra região
africana, conhecida como o Chifre da África, encontrava-se a Etiópia, no qual
já no século VII possuía em seus domínios dois grandes reinos, Axum e Adulis.
Em relação a Axum, sabe-se que esse era o reino mais rico do território.
Entretanto, ainda no século VII, o reino de Axum passou pro profundas
transformações, isso em decorrência, da invasão muçulmana. Nesse sentido,
“Essa ocupação do
norte da Etiópia pelos bedja (daí o atual nome de Beguender, terra de bedja) é
certamente o reflexo de um certo enfraquecimento do poder de Axum, mas a
pressão que os bedje exerceram desde então acentuaria o declínio da potência
axumita” (SILVÉRIO, 2013, p. 379).
Logo após, são
retratados outros territórios como o de Madagascar, Chade e Costa do Marfim. De
maneira que, podemos destacar também o Mali e a expansão Manden. Em relação a
esse povo, Silvério (2010, p. 442-443) discorre que, “[o] povo manden (Mandenka
ou Mandingo) compreende vários grupos e subgrupos, dispersos por toda a zona sudano-saheliana,
do Atlântico até o maciço do Air, com projeções profundas nas florestas do
Golfo do Benin”.
Sabe-se que foi
a partir da expansão desse povo que surgiu o Mali. Entretanto, esses grupos
travaram grandes batalhas pelo território contra o povo sosoe. Com a vitória
manden, ocorreu também a expansão do Islã naquele local. Em relação aos líderes
do Mali,
“Mansa Musa I
91307-13320 foi o mais conhecido dos imperadores do Mali, e essa reputação se
deveu à sua peregrinação a Meca em 1325 e, sobretudo, à Cairo, onde distribuiu
ouro em tal quantidade que fez baixar a cotação do precioso metal por muito
tempo” (SILVÉRIO, 2010, p. 445).
No auge do
império Mali ele abrangia diversos lugarejos. Sendo que, havia um intenso
comércio entre as caravanas; além disso, a extração de sal e a de minério
colaborava com o aumento da riqueza de seus líderes. Entre os principais grupos
habitantes do Mali estavam
“(...) de oeste
para leste, os diolof (wolof), mandenka e os soninke. Sabemos, pelos cronistas
de Tombuctu, que o Mali era muito povoado, especialmente a região de Djenné. A
oralidade como meio de transmissão era muito importante. Pode-se admitir que a
população do Mali chegava, à época, a 40-50 milhões de habitantes” (SILVÉRIO,
2010, p. 446).
Toda a
organização era baseada em líderes locais, que contavam com um forte exército
que dava estabilidade política e econômica ao território. O império era
conhecido também como um local que possuía grandes ferreiros que produziam
objetos feitos a mão que poderiam ser utilizados para a prática agrícola ou
para a produção de armas. Já o artesanato era pertencente a alta sociedade.
Após essa breve
apreciação da “Síntese da coleção História Geral
da África: Pré-história ao século XVI”
é possível compreender que é interessante e válida essas iniciativas que
fomentem mais estudos da história da África, no entanto, pode-se identificar
que a síntese em questão ainda é muito restrita ao ambiente escolar, isso em
decorrência principalmente pela abordagem complexa sobre os temas. Nesse
sentido, o professor que pretenda utilizá-la terá que se desdobrar para ensinar
o seu conteúdo em sala de aula. Ademais, seria importante se os autores de
livros didáticos incorporassem essa síntese como referencial em seus trabalhos.
Visto que, o material didático ainda trabalha muito pouco sobre essa temática.
Entretanto, ressalta-se que, a escrita desse conteúdo teria que ser mais
simples e objetiva para um maior entendimento dos estudantes.
Entende-se,
portanto, que o sucinto estudo elaborado, pode ser útil para se trabalhar
alguns territórios que muitas vezes não são eleitos pelos professores como temas
de estudo durante os séculos abordados nessa comunicação, como: o Sudão, a Zona
guineana, o Níger, a Etiópia e o Mali.
REFERÊNCIAS:
Edivaldo Rafael de Souza é Graduado em História pelo Centro Universitário de Patos de Minas (UNIPAM). É Especialista em Metodologia do Ensino de Sociologia pelo Instituto Superior de Educação Ateneu (ISEAT). Pós-graduado em Biblioteconomia pela Faculdade Futura e graduando em Serviço Social pela Universidade Santo Amaro (UNISA). É também professor regente de aulas de História na Secretaria Estadual de Educação de Minas Gerais (SEE-MG). E-mail: edivaldorafael007@gmail.com
FONSECA,
Mariana Bracks. Rainha nzinga mbandi,
imbangalas e
portugueses: as guerras nos
kilombos de Angola no século. XVII Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v.23, n.2,
jul./dez. 2010.
FUNDAÇÃO
PALMARES. Baixe aqui os volumes da
coleção História Geral da África. 2011. Disponível
em: http://www.palmares.gov.br/?p=10900. Acesso em: 15
fev. 2020.
SILVÉRIO,
Valter Roberto; coord. Síntese da coleção
História Geral da África: Pré-história ao século XVI. Brasília: UNESCO,
MEC, UFSCar, 2013.
UNESCO. Coleção História Geral da África em português. 2010. Disponível em:
http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/about-this-office/singleview/news/general_history_of_africa_collection_in_portuguese_pdf_only/. Acesso em: 15
fev. 2020.
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